sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Ela colecionava sonhos que jamais se realizariam.

Caminhando por entre sonhos perdidos ela encontrou uma porta semi aberta. Um homem de olhar familiar acena para ela entrar. A sala amanhecida trazia na imagem da mesa um café não terminado. Vasculhou seu olhar por entre os objetos perdidos espalhados pelo chão. Olhou para o quarto tão próximo. Um quadro verticalizado refletia a imagem de uma pessoa totalmente estranha. Ao lado da luz, ainda acesa, uma vela consumia o recomeço. Andou para a esquerda e na estante viu seu livro preferido. Aproximou-se com cuidado mirando o homem que consentiu com um sorriso. Reconheceu sua assinatura na primeira página, uma dedicatória. Revirou o sentimento de pertença, entendeu o que tinha perdido. Suou frio e deixou-se cair por entre suas certezas. O homem ofereceu seu sonho perdido. Sentaram-se à beira da mesa. O livro ainda marcado, por caneta marca texto, revelava palavras pinçadas por quereres descobertos. Ela captou o olhar vazio, pensativo encontrando o seu. O homem folheia calmamente a vida deles em busca do sentido. O livro já amarelado e um pouco empoeirado vai reconstruindo uma memória esquecida, aquecida. Ficaram assim, a folhear o Tempo com a ajuda do Vento que soprava sem pedir licença palavras de coragem. A mão enrugada traçava o quanto tinham vivido e o tremor anunciava a delícia de recomeçar. Colocaram o livro de volta na estante com novas palavras marcadas por um suspiro. Ela contempla a estante, sai caminhando por entre a ventania. Olha para trás e seus olhares confessam: 

Ele só existia para completar o sonho jamais vivido!